domingo, 15 de abril de 2012

O PESCADOR E O CORRUPTO

Manhã quente e sonolenta. As nuvens ainda brincando de esconder o sol. Saí de bicicleta e fui até o molhe, ao sul da praia, onde há uma praça com bancos, ponto de excelência para quem deseja apreciar a paisagem e tirar fotos.

Observei que dois bancos estavam totalmente ocupados por tralhas de um pescador esportivo que espalhou iscas, anzóis, boias, geladeira térmica e camarões vencidos. Um espaço onde poderiam se acomodar, confortavelmente, seis pessoas sentadas.

-  Isso não é certo, pensei.  Nas imediações, vários ônibus de turismo estavam estacionando. Não me contive.  Abordei o pescador e, delicadamente, sugeri que  colocasse as tralhas em outro local, deixando os bancos para os turistas. Agradeci e afastei-me. Ele começou a tirar seu material, a contragosto, o mais lentamente que podia.

Um senhor se aproximou, dando-me os parabéns. Estava também incomodado com a situação. Acrescentou que não é preciso erudição para distinguir o certo do errado, isso é intrínseco em cada ser humano.  Por que não se opta pelo certo? Por que o melhor para cada um predomina sobre o que poderia beneficiar coletivamente toda a sociedade?

Parece que o conhecimento do certo apenas se restringe ao que esperamos que os outros nos façam. Essa atitude egocêntrica, nesses tempos de tanto avanço tecnológico,  é um contrassenso em relação ao pacto proposto no Contrato Social, publicado em 1762, onde Rousseau pontua que para viver em sociedade cada um deve abrir mão de certas liberdades, aceitando um conjunto de regras e condutas que trazem vantagens e benefícios para todos.

Aquele pescador, que chegara cedo para ocupar dois bancos em detrimento dos turistas, é como o político que destina de forma desastrada o dinheiro público, desviando-o do seu caráter social de gerador do bem-estar coletivo. Infelizmente, a cada dia circulam novas notícias de fortunas suspeitas depositadas em paraísos fiscais, lavagem de dinheiro, nepotismo, corrupção e concussão, fazendo um triste contraponto com o cidadão que aguarda atendimento médico ou  morre  na fila de um hospital público que agoniza sem verbas para manter sua estrutura.

A abrangência das atitudes do pescador e dos agentes públicos se assemelha na falta de utilização do bom-senso, na predominância da escolha do errado em detrimento do certo, nas atitudes egoístas e no descaso com os outros.

O sol já brilhava mais forte com o afastamento das nuvens e a manhã encheu-se de cores. Ao parar para tomar água observei uma mulher com seu filho pequeno, ambos frustrados com um brinquedo quebrado, desses importados, que custam pouco e duram menos ainda.

Não sabendo o que fazer para distrair a criança, a mãe, num ímpeto de criatividade destrutiva, começou a ensinar o filho a enterrar na areia as pilhas que sobraram do brinquedo.  Peguei a bicicleta e tomei o rumo de casa. Já tivera o bastante para aquela manhã de domingo.

Nenhum comentário: