quinta-feira, 28 de março de 2013

O SIRI E O BEBÊ ABANDONADO



Certa vez, procurando um bom lugar para espetar meu guarda-sol, deparei-me com o menor siri que já havia visto e que, ao perceber minha aproximação, entrou em pânico, procurando um buraquinho na areia para se esconder.


O desavisado crustáceo afastara-se demais de sua proteção e estava ali, diante do perigo que representava a minha presença.

De repente, surgiu em desabalada corrida um grande siri com suas pinças levantadas em posição de luta e, enquanto me encarava desafiador, agarrou o pequenino, segurando-o junto ao corpo, fugindo com agilidade até sumir dentro de um buraco mais afastado.

Eu acabara de testemunhar uma cena incrível. A mãe siri veio enfrentar um inimigo perigoso para ajudar o seu filhotinho. Um animal de pouca complexidade, se comparado com a raça humana, arriscou a própria vida para salvar a sua cria.

Por outro lado, recorrentes são as histórias de recém-nascidos abandonados por suas mães. São bebês encontrados em caçambas, no chão e até mesmo no lixo.

Os detalhes são apresentados na TV por apresentadores consternados e indignados. Não poderia ser diferente, a proteção à prole é natural, inata e faz parte dos instintos dos seres vivos, de todos os gêneros e espécies, por mais simplórios que pareçam.

Será um sinal dos tempos motivado principalmente pela miséria, uso de drogas, entre outros?

Não. Infelizmente, foi sempre assim. O abandono de bebês está retratado tanto na bíblia como nas histórias infantis. No passado havia até a roda dos enjeitados que era um mecanismo similar a uma porta giratória instalado num convento onde, no anonimato das madrugadas, a mãe colocava o recém-nascido e girava o dispositivo para que fosse resgatado pelas freiras, lá dentro.

A atual legislação brasileira prevê que qualquer gestante que queira entregar o filho para ser adotado deve procurar a vara da infância e juventude de seu município, que fará a intermediação entre essa mãe, que não quer ou não pode criar o seu filho e aquele casal cheio de amor, que muitas vezes já tem o quartinho do bebê decorado, a gaveta da cômoda cheia de sapatinhos delicadamente tricotados e que está aguardando, na lista de espera da adoção, a chegada do bebê querido, que vai ser copiosamente amado.

A mãe que utiliza a via legal fica isenta de qualquer responsabilização, não incorrendo em fato delituoso, como acontece quando o bebê é abandonado, que é crime, com pena de seis meses a dois anos de detenção, se não houver lesão corporal. Quando o abandono resulta em morte, a pena mínima é de dois anos, podendo chegar a seis anos de detenção.

Talvez o noticiário, no lugar da consternação costumeira, devesse informar os passos legais desse procedimento, evitando que novos bebês sejam colocados em sacos plásticos, abandonados ao relento, jogados em lagoas, atitudes desesperadas e irracionais que podem condená-los a sequelas que carregarão por toda a vida.

Nesse ínterim entre a melhor divulgação dos procedimentos legais para dar um recém-nascido em adoção e a próxima notícia de abandono, aquela mamãe siri lá na praia nos dá uma preciosa lição, demonstrando, com dignidade e coragem, aquilo que falta em muitos seres humanos.


Eliana Ruiz Jimenez - Balneário Camboriú/SC



foto: http://t0.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcS64FGpMDSjgMVVZFFmHMYtngrAnpwtPbDq73eH3LKy7ewNQ7Ai

2 comentários:

Dáguima Verônica disse...

Eliana, poucas vezes tive o prazer de ver blogs instrutivos , bonitos , modernos e de fácil acesso como os seus.Amei suas crônicas. Parabéns.

Antonio Juraci Siqueira disse...

Poeta,por absoluta falta de tempo ainda não havia ido além das trovas do seu blog.Hoje, domingo, separei a melhor fatia do meu tempo para ler suas crônicas portadoras de mensagens altamente reflexivas. Obrigado por nos oferecer momentos de ternura e sabedoria.